Fonte: Biblioteca Digital de Literatura de Países Lusófonos

LITERATURA BRASILEIRA
Textos literários em meio eletrônico
Quinta parte, do Padre António Vieira


Edição de Referência:
Sermões, Padre Antônio Vieira, Erechim: Edelbra, 1998.

QUINTA PARTE [1]

Na oficina de Miguel Deslandes, Impressor de Sua Majestade, à custa de Antônio Leite Pereira, Mercador de Livros.

MDCLXXXIX

Com todas as licenças necessárias e privilégio real.

CENSURA DOM. R. P. M. FR. ANTÔNIO DE SANTO TOMÁS, RELIGIOSO DA SERÁFICA ORDEM DE S. FRANCISCO. QUALIFICADOR DO SANTO OFÍCIO.                                     

EMINENTÍSSIMO SENHOR.

Vi este livro, Quinta Parte dos Sermões do P M. Antônio Vieira, da religiosís­sima Companhia de Jesus, e pregador de Sua Majestade: é livro quinto em número, e no excelente, entre os do autor, pode ser primeiro, sendo que tudo seu, competindo só entre si, não parece ter segundo; e assim este, com os mais, em equilíbrio bem parece efeito do singular engenho do tal autor, pois nele, como nos outros, o espírito e estilo é o próprio, corrente, e o mais subido, douto, dócil, grave, elegante, e tão claro, ainda no que discorre como teólogo, que à gente de toda a sorte que o ler, se fará inteligível — segundo a capacidade de cada um — o seu discurso, graça sem igual de tão esclarecido pregador; e não é desigual à que, não só neste, mas em quase todos os seus escritos mostra a experiência que até no vulgar da Escritura Santa, sobre que conceitua, e prova como escriturário, e se avantaja tanto que, em vulgari­dades mais usuais dela, e mui repetidas a cada passo, inova raríssimos conceitos e admiráveis provas o seu juízo. E por isso parece ao de alguns, depois de lido em qualquer livro seu — como já pareceu ao de muitos, quando ouvido este grande pregador em o púlpito — que dirão o mesmo que ele diz; mas, sem que o venham a dizer nunca, todos o publicam sempre — publicidade que também merecerá a lição deste quinto livro — por único nesta vantagem. Esta vantagem, e as mais que respei­tam todos neste autor à competência, o dão a respeitar por maior que toda a emula­ção; e assim parece deveras, pois, não só para com estranhos mas para com portu­gueses, onde aquela é mais viva, vive geralmente aplaudido pelo sujeito na prédica mais extremado, e não passa o extremo a excesso neste geral aplauso — sendo o de naturais como impossível — porque primeiro eles com a voz de estranhos o reconhe­cem pregador em tudo peregrino, todo discreto, todo político, todo erudito, e eloqüente todo, incomparável, enfim, no bem que instrui, persuade, rende e edifica quanto ao espírito, como se vê particularmente em os sermões vários que contém este livro, que todo nesta sua variedade, com o afeto do idioma português mais deleitável, está respirando doutrina santa, conforme em tudo a nossa santa fé e bons costumes. Pelo que será benefício comum, e mui do serviço de Deus, conceder a licença que se pede, para que se publique mediante a imprensa. Lisboa, Convento de São Francisco da Cidade, em 30 de abril de 1688.

Fr. Antônio de Santo Tomas.

CENSURA DO M. R. P M. FR . TOMÉ DA CONCEIÇÃO DA SAGRADA ORDEM DO CARMO, QUALIFICADOR DO SANTO OFÍCIO.

EMINENTÍSSIMO SENHOR,                                  

Vi esta Quinta Parte dos Sermões do Pe. Antônio Vieira, da Sagrada Religião da Companhia de Jesus, e pregador de Sua Majestade, e, acabando de os ler com atenção, sem achar neles coisa alguma digna de reparo, admirando, não sei se o gênio ou arte deste insigne talento, só sei dizer que os seus Sermões são dignos de mais preciosa estampa que a da comum imprensa, e o mesmo juízo que já formei sobre outros seus, formo agora destes. Lisboa, em o Convento do Carmo, 30 de maio de 1688.

Fr. Tomé da Conceição

CENSURA DO P. M. MANOEL DE SOUSA, PREPÓSITO DA CONGREGAÇÃO  DO ORATÓRIO DE S. FILIPE NERI.

SENHOR.

Por mandado de Vossa Majestade vi estes sermões do Pe. Antônio Vieira, da  sagrada Companhia de Jesus. O nome do seu autor, que trazem na primeira página, basta para o maior elogio desta obra. Que muito faça o nome do Pe. Antônio Vieira impresso o que Valério Máximo disse do nome de Demóstenes ouvido: Cujus commemorato nomine maximae eloquentiae consummatio audientis animo oboritur — e com tanta mais razão quanto é mais aplaudido em todo o mundo o Pe. Antônio Vieira por príncipe da eloqüência sagrada do que o foi Demóstenes por príncipe da eloqüência grega. E justamente é mais aplaudido, pois é entre todos os pregadores o que o sol entre todas as luzes. Santo Agostinho diz que o sol é próprio símbolo do pregador evangélico, e deste o é propriíssimo,  porque nele se vêem todas as proprie­dades do sol, não só ao vivo, mas com excesso. Ao sol chamou o Eclesiástico instrumento ou vaso admirável do Todo-Poderoso, e obra digna do Altíssimo: Vas admirabile, opus Excelsi. Quem mais admirável que o Pe. Antônio Vieira nos seus sermões, admiráveis em tudo, como procedidos do seu entendimento, vaso de luzes verdadeiramente admirável: vas admirabile — e obra singular de Deus: opus Excelsi? — que parece o fez com especial providência, para que víssemos até donde pode chegar o entendimento humano ajudado do poder divino. Absorve o sol a luz de todos os astros: com a do Pe. Antônio Vieira parece que fica absorta a dos mais engenhos. A luz do sol faz manifestos os lugares mais tenebrosos: a inteligência do Pe. Antônio Vieira faz claros os lugares da Sagrada Escritura mais escuros. Penetra o sol a profundidade dos abismos, para neles formar o ouro e os diamantes: penetra o Pe. Antônio Vieira os corações humanos, abismos mais profundos, e com a eficá­cia da sua persuasão introduz neles o ouro puro da caridade e os diamantes das sólidas virtudes. Único é o sol, e o Pe. Antônio Vieira também é único: é o fênix do nosso século. Fabuloso é o fênix, mas verdadeiro no que representa; o verdadeiro fênix — como em vários lugares prova o doutíssimo Pe. Cornélio a Lápide — é o sol, porque, para representar as qualidades deste planeta inventaram os egípcios estafábula, ao que — no sentir do mesmo autor — aludiu o profeta Malaquias, introduzindo ao sol com penas ou com asas. É, pois, o sol fênix da esfera quarta, e o Pe. Antônio Vieira fênix da nossa esfera: fênix escrevendo, melhor que o sol voando; fênix só com a pena de seus escritos, melhor que o sol com as penas de seus raios. Desta sorte se vêm retratadas neste sol racional as propriedades do sol visível. Porém, não só as retrata ao vivo, mas com excesso, porque a luz do sol não se dilata mais que por um hemisfério, e a do Pe. Antônio Vieira por dois: estando no da América, também alumia ao da Europa; quando reside além da Linha, resplandece em Lisboa, e dela, por meio da imprensa, em todo o mundo. O sol, tanto que declina para o ocaso, modera os resplendores: o Pe. Antônio Vieira, tão declinado já pelos anos ao seu ocaso, reforça agora mais as luzes. Enfim, o sol já parou e já retrocedeu, e o Pe. Antônio Vieira nunca retrocedeu nem parou: nunca parou no zelo, nunca retrocedeu no estilo. Não há coisa nestes sermões que desdiga do real serviço de Vossa Majestade, e, se alguém sentisse o contrário, se lhe poderia dizer o que Pitá­goras disse do sol: Contra solem ne loquaris: do Sol não há que dizer — do Pe. Antônio Vieira não há que notar. O que eu quisera, Senhor, é, que todos os que lessem estes sermões se não satisfizessem só da sua luz, mas que também se deixas­sem penetrar do seu calor: a luz lhes infundiu seu autor pelo entendimento, o calor pelo espírito; a luz é plausível, mas o calor útil; muitos — como ordinariamente sucede no mundo — não fazem caso do útil, fazem todo o caso do plausível: embe­bem-se de todo no plausível do conceito, que os lisonjeia, e deixam o útil do espíri­to, que os desengana, e, depois de uma lição tão eficaz, como a destes Sermões, ficam com os entendimentos admirados, mas com os corações tão frios, como antes, no amor de Deus. A santidade e virtude não consiste nas especulações do entendi­mento, mas nas determinações da vontade: se a vontade não tiver calor para bem obrar pouco importa a luz do entendimento, que pára no entender; deve, pois, quem ler estes sermões atender mais ao calor do espírito, que se encerra na sua doutrina, do que à luz do entendimento, que se difunde na sua elegância. Seja a conclusão a do mesmo Eclesiástico, quando louva ao sol; Magnus Dominus qui fecit illum, et in sermonibus ejus festinavit iter [2] Não há melhor modo para louvar ao sol que louvar a Deus, que o criou tão luminoso; assim também, à vista do sol deste felicíssimo engenho, o melhor louvor a Deus que o fez tão sábio. O sol faz o seu caminho com a palavra de Deus: e o Pe. Antônio Vieira com a palavra de Deus faz o seu caminho: in sermonibus ejus festinavit iter. O sol, com a palavra de Deus, faz o seu caminho pelo zodíaco, que se divide por doze signos, e o Pe. Antônio Vieira, com a palavra de Deus, faz o caminho dos seus sermões, que divide por doze tomos, que são os doze signos deste sol. Deste número, que nos prometeu na Primeira Parte, é esta a Quinta: importa que apresse-as mais, e que Vossa Majestade lho mande assim, para que, como Sol, lhe não falte esta prerrogativa da diligência, e se diga então cabalmente dele o que do Sol: Et in sermonibus ejus festinavit iter. Este é o meu parecer, se o pode dar nesta matéria quem como eu tem tão pouco de águia, pois só as águias podem examinar os raios do Sol. Vossa Majestade mandará o que mais for de seu serviço. Lisboa, e Congregação do Oratório, 26 de junho de 1688.

Manoel de Sousa.

LICENÇAS DA RELIGIÃO

Eu, Alexandre de Gusmão, da Companhia de Jesus, provincial da Província do Brasil, por especial comissão que tenho de nosso M. R. P. Vigário Geral, Domingos Maria de Marinis, dou licença para que se possa imprimir este quinto tomo dos Sermões do Padre Antônio Vieira, da mesma Companhia, Pregador de sua Majestade, o qual foi revisto e aprovado por religiosos doutos dela, por nós deputados para isso. E em testemunho da verdade, dei esta assinada com meu sinal, e selada com o selo de meu ofício. Dada na Bahia, em 12 de agosto de 1687. Alexandre de Gusmão      

DO SANTO OFÍCIO                                            

Vistas as informações, podem-se imprimir os Sermões de que esta petição faz menção, autor o Pe. Antônio Vieira, da Companhia de Jesus, e depois de impressos tornarão para se conferir e dar licença que corram, e sem ela não correrão. Lisboa, o  primeiro de junho de 1688.

Jerônimo Soares,

João da Costa Pimenta,

Bento de Beja de Noronha,

Pedro de Ataide de Castro,

Fr. Vicente de Santo Tomás,

Estêvão de Brito Foios,

João de Azevedo.

DO ORDINÁRIO.

Podem-se imprimir os Sermões de que a petição faz menção, e depois de impressos tornarão para se conferirem e se dar licença para correr, e sem ela não correrão. Lisboa, 30 de junho de 1688. 

Serrão

DO PAÇO

Podem-se imprimir, vistas as licenças do Santo ofício e do Ordinário, e depois de impressos tornarão à Mesa para se conferirem e taxarem, e sem isso não correrão. Lisboa, 28 de junho de 1688.

Melo P. Lamprea Ribeiro.

Concorda com seu original. Carmo de Lisboa, 18 de fevereiro de 1689.

Fr. Tomé da Conceição.


Visto estar conforme com seu original, pode correr. Lisboa 18 de fevereiro de 1689.  

Jerônimo Soares,

João da Costa Pimenta,

Bento de Beja de Noronha,

Pedro de Ataide de Castro,

Fr. Vicente de Santo Tomás,

Estêvão de Brito Foios

Pode correr. Lisboa, 19 de fevereiro de 1689.

Serrão

Taxam este livro em doze tostões. Lisboa, 21 de fevereiro de 1689.

Roxas

Lamprea

Marchão

Ribeiro.

Núcleo de Pesquisas em Informática, Literatura e Lingüística

[1] A designação de Quinta parte pressupõe a exclusão dos trinta sermões dedicados ao Rosário, já publicados nesta edição.

[2] Grande é o Senhor que o criou, e ele apressa a sua carreira para lhe obedecer (Eclo.43,5).