Fonte: Biblioteca Digital de Literatura de Países Lusófonos

LITERATURA BRASILEIRA

Textos literários em meio eletrônico

O parto sem dor, de Maura de Senna


Texto-fonte:

Maura de Senna Pereira, O parto sem dor,

Rio de Janeiro: Organização Simões Editora, 1957.

ÍNDICE

Vencido, pela medicina, o problema do parto sem dor

O parto sem dor explicado em seis lições

Diminui o número de partos anormais

Elas dizem que não sentiram dor     

 

A velha maldição bíblica... - Cerca de uma centena de partos sem dor ocorridos no Rio - A teoria dos reflexos condicionados de Pavlov como base da descoberta – A palavra de Pio XII – Em julho, a primeira conferência brasileira sobre partos sem dor - Ouvindo, na maternidade Clara Basbaum, assistentes do professor Grelle.

O Curso de Divulgação da Teoria de Pavlov, ministrado em novembro do ano passado na Associação Médica do Distrito Federal e promovido pela Sociedade Pavlov de Fisiologia e Me­dicina, de S. Paulo, foi um movimento de divulgação científica que despertou o maior interesse, um fato novo em nossa vida cultural. Um dos conferen­cistas, o obstetra paulista Hirsch Schor, que discorreu sobre o "Método psico­-profilático da abolição da dor no tra­balho do parto", trouxe ao conhecimen­to do auditório o resultado de suas ex­periências e êxitos em S. Paulo e anun­ciou que, dentro de dias, aqui no Rio, na Maternidade Clara Basbaum, uma equipe de médicos ia preparar turmas de gestantes para o parto sem dor.

Tendo notícias de que esse traba­lho estava sendo processado e achando que o novo método representa a derrubada de um fardo milenar e que, por isso mesmo, merece a mais ampla di­vulgação, pois traz um sentido mais belo e mais justo à vida, resolvemos visitar a Maternidade Clara Basbaum.

Localizada à rua da Passagem, n.° 90, é uma dependência da Santa Casa da Misericórdia, atendendo gratuitamen­te a senhoras indigentes, e, segundo nos declara a administradora da Maternida­de, D. Maria Cecy Osório, é ao Sr. Adolfo Basbaum, mordomo da Santa Casa junto à Maternidade, que se deve uma grande parte dessa cotidiana ativi­dade assistencial.

A direção está a cargo do doutor Francisco Carlos Grelle, que se acha ro­deado de uma operosa equipe de jovens médicos, dentre os quais pudemos conhe­cer aqueles que mais se dedicam ao ca­pítulo novo e humano dos partos sem dor. No meio destes, vamos reencontrar a moça que secretariou o Curso Pavlov, a Dra. Elza Puretz, que foi quem, em nome dos seus colegas, nos concedeu a presente entrevista.

INTERPRETAÇÃO DAS CAUSAS DA DOR NO TRABALHO DO PARTO

O primeiro ponto abordado tinha de ser o referente ao fato de, não sendo uma fatalidade, como a nova ciência está demonstrando, a dor do parto, ter essa dor existido sempre.

— Mas não existiu sempre — vai logo esclarecendo a doutora.

Explica então que, nos tempos pri­mitivos, o dar à luz era isento de sofri­mento, como acontece ainda com os po­vos selvagens, desde que preservados do contacto dos brancos. Frisa que o par­to é um ato fisiológico e, como os de­mais atos fisiológicos, é natural e não doloroso. Entretanto, na antiguidade, as mulheres se casavam extremamente jovens e, sendo quase crianças, não ti­nham os órgãos plenamente desenvolvi­dos para o exercício da maternidade, ocasionando sofrimentos e, não raro, óbitos. É preciso ainda pensar nas fe­bres e infecções dos tempos em que não existiam antissépticos e antibióticos. Tu­do isso e o tremendo verso bíblico tam­bém, aquela antiga maldição do "paries in dolore" — foram formando a tradi­ção secular, o complexo, a espera do sofrimento, o reflexo doloroso final­mente.

A PALAVRA DO PAPA

Então, conversamos sobre as incom­preensões em torno do assunto (pois o que, antes de tudo, precisa ficar bem claro é que não se usa qualquer espécie de anestésico) e, também, sobre as de­turpações, a incredulidade, a teimosia, a resistência. Estão aí, por exemplo, a avó, a mãe, a sogra, a tia, a vizinha, a amiga, prontas para dizer à jovem par­turiente que ela se prepare para o sa­crifício. Quanto à resistência por mo­tivos religiosos, não poderia haver pa­lavra mais autorizada para vencê-la do que a que proferiu recentemente o Papa Pio XII.

D. Maria Cecy Osório, a adminis­tradora, assiste a uma grande parte da entrevista. Ela está completamente em dia com tudo que se tem escrito sobre o assunto e, nesta altura da palestra, tira de sua pasta um recorte e destaca um trecho da alocução dirigida por Sua Santidade a um grupo de obstetras ita­lianos e estrangeiros: "A ciência e a técnica podem, portanto, utilizar as con­clusões da psicologia experimental, da fisiologia e da ginecologia, (como no método psico-profilático), a fim de eli­minar as fontes de erros e os reflexos condicionados dolorosos e tornar o parto tão indolor quanto possível; a Escritura não o proíbe".

A TEORIA DOS REFLEXOS CONDICIONADOS

A entrevista vai, agora, chegando à raiz do método, à fonte da descoberta, que é, precisamente, a teoria dos refle­xos condicionados.

A Dra. Elza cita a data de 1897, ano em que Pavlov realizou as suas pri­meiras experiências, criando a teoria re­volucionária dos reflexos condicionados, na qual iria basear-se — mais tarde, muito mais tarde, no ano de 1920 — a descoberta do método que suprime a dor no trabalho do parto.

Com a sua palavra muito clara, de quem está habituada a transmitir conhe­cimentos, recorda a história do cãozinho de Pavlov. O fisiologista estudava os sucos digestivos e observou que, toda vez que chegava ao laboratório, o animal começava a salivar, porque sabia que ele lhe levava alimento. Resolveu, en­tão, Pavlov acionar uma campainha ao dar o alimento ao cão. Repetiu muitas vezes a associação e, por fim, usou, ape­nas, a campainha, observando que o cão salivava ao ouvi-la, embora sem receber alimento. Estava descoberto o reflexo condicionado.

A Dra. Elza define:

— Reflexo é a relação do indivíduo com o meio.

Prossegue, explicando que há os re­flexos incondicionados, que são inatos, insubstituíveis : respirar, chorar, abrir e fechar os olhos, salivar ao contacto do alimento, etc. Os condicionados são os adquiridos, os que podem desaparecer, ser substituídos, voltar. A sede dos re­flexos condicionados é a córtex, a parte do cérebro que comanda toda a nossa vida.

PARTO SEM DOR

Continuando a sua exposição, a nossa entrevistada afirma que o parto sem dor é baseado na teoria dos refle­xos condicionados.

Os primeiros estudos foram feitos na Rússia, em 1920, por Velvosky, Chougom e outros médicos ; mas, só em 1950, foi o novo método oficializado na­quele país, que pode hoje apresentar a alta cifra de meio milhão de partos sem dor.

Em 1933, na Inglaterra, Read, com o uso da ginástica, método importante mas não baseado nos reflexos condicio­nados, inicia estudos do denominado parto sem temor.

Lamaze, diretor da Maternidade dos Metalúrgicos de Paris, que estudara na Rússia, com Nicolaiev, o método psico-­profilático, inaugura-o na França em 51.

O parto sem dor é praticado em muitos outros países europeus, especial­mente nos nórdicos.

NO BRASIL

Quanto ao Brasil, ficamos sabendo que o Dr. Schor estudou na França com Lamaze e, em 55, realizou em São Paulo as suas primeiras experiências. Em São Paulo, temos ainda o Dr. Blay, obs­tetra da Casa Maternal da Fundação Leonor de Barros, e o Dr. Goldstein. Foram estes dois médicos que dirigiram o primeiro curso na Maternidade Clara Basbaum, fato que ocorreu logo após as mencionadas conferências do Curso Pavlov. Em dezembro do ano passado, o Dr. Schor ministrou um curso no IPASE. Sabe-se também que alguns médicos que têm estagiado na Materni­dade Clara Basbaum, vindos de vários pontos do país, estão procurando divul­gar o método em seus Estados.

NA MATERNIDADE CLARA BASBAUM

A equipe de médicos que tem a res­ponsabilidade dos partos sem dor na Maternidade Clara Basbaum, é dirigida pelo professor Francisco Carlos Grane. Os principais assistentes são : doutores Jean Claude Nahoum, Elza Puretz Herzenhut, Paulo Belfort de Aguiar, Dulce Morgado Castellar, Daniel Boe­chat, Arnaldo Ferreira, Paulino Perez, Luiz Beethoven do Amaral, Olivia Granado, Julio Gomes, Fausto Grelle, Vera Agnese, Paulo Dias Novais, Anna Lydia Blatter Pinto e doutorando Dionísio Cavalheiro.

As aulas (que serão objeto de uma outra reportagem) começam no sétimo mês da gravidez, sendo que cerca de cem parturientes já fizeram o seu curso, o que quer dizer: deram à luz sem so­frimento, precisamente porque aprende­ram a substituir o reflexo condicionado doloroso, formado através dos séculos pelas causas já conhecidas, por um outro reflexo condicionado, que é a aceitação do parto como um ato natural, isento de dor.

As aulas são semanais e ministra­das a turmas de dez ou doze gestantes. São em número de seis:

A 1 — Atividade nervosa superior e motivação; A 2— A respiração ; A 3 — Educação neuro-muscular; A 4 — Parto : período de dilatação ; A 5 — Parto : período de expulsão; A 6 — Re­visão e ambientação. (Agora, a ges­tante, de posse de um novo reflexo con­dicionado, vai conhecer a sala onde dará à luz, os instrumentos que serão usados pelo parteiro, etc.) .

A conversa tinha sido longa, mas fazemos ainda sobre o curso duas per­guntas: a primeira sobre o material hu­mano e a segunda sobre o fator tempo: o parto sem dor dura menos que o do­loroso?

Quem responde é a Dra. Dulce Mor­gado Castellar :

— As nossas alunas, — declara — matriculadas no Ambulatório Pré-Natal, são quase todas de condição humilde: lavadeiras, empregadas domésticas, etc., sendo que 50% são analfabetas, o que não impede que tenham mostrado o me­lhor aproveitamento.

Acrescenta que alguns médicos pra­ticam o parto sem dor em suas clinicas particulares, encontrando-se aí mulheres de nível intelectual mais elevado: profes­soras, funcionárias, etc.

Quanto à segunda pergunta, in­forma:

— A nossa experiência parece-nos mostrar que há uma diminuição de tem­po no parto sem dor.

1ª. CONFERÊNCIA BRASILEIRA

— Agora, já não é só aqui, em nos­sa Maternidade — volta a esclarecer a Dra. Elza — que se faz o parto sem dor, pois acabamos de receber comuni­cações nesse sentido da Maternidade da Santa Casa, da Casa da Mãe Pobre, do Serviço do Professor Aguinaga (Hos­pital São Francisco de Assis) e do Hos­pital do IPASE (sob a direção do pro­fessor Waldir Tostes).

Mas a última palavra da Dra. Elza Puretz não é nenhuma resposta. É, sim, uma notícia espontânea e entusiasma­da, que aqui transmitimos em primeira mão : em julho, na capital paulista, rea­lizar-se-á a 1ª. Conferência Brasileira

Sobre Partos sem Dor, que será presi­dida pelo professor Octavio Rodrigues Lima, renomado obstetra e diretor da Maternidade-Escola de Laranjeiras.

 

O parto sem dor ex­plicado em seis lições

O cérebro a tudo comanda — A respiração e o relaxamento muscular são reflexos detidamente estudados na maternidade Clara Basbaum

Em nossa primeira reportagem, foi o problema do parto sem dor focali­zado em suas linhas gerais. Nesta se­gunda, enfrentamos já a parte técnica, tomando conhecimento detalhado do curso ministrado às gestantes, com o propósito de prepará-las para dar à luz sem dor, acontecimento maravilhoso, porque não é oriundo de nenhum anes­tésico, medicamento ou forma de hipno­se, mas unicamente das próprias forças naturais da gestante, que se torna apta a responder às contrações uterinas não mais com o velho reflexo negativo da dor, mas com os novos reflexos condi­cionados adquiridos durante a prepa­ração.

Eis-nos, pois, novamente na Mater­nidade Clara Basbaum, assistindo a duas aulas e conversando com alguns dos médicos mais responsáveis pela aplicação do método psico-profilático da abo­lição da dor no trabalho do parto.

PRIMEIROS ENSINAMENTOS

As gestantes matriculadas no Am­bulatório Pré-Natal que querem fazer o curso, são distribuídas em turmas (de dez, mais, ou menos). Como vimos na primeira reportagem, as aulas são em número de seis e começam a ser minis­tradas no sétimo mês da gestação. Os ensinamentos são dados por uma equipe de médicos e doutorandos, dirigida pelo professor Francisco Carlos Grelle, que é auxiliado por um dedicado grupo de chefes de equipe, cujos nomes já divul­gamos.

Agora, temos à nossa frente alguns desses assistentes, que nos vão falar sobre a teoria e a prática ministradas no curso psico-profilático.

— O método psico-profilático — define o Dr. Daniel Boechat — se es­triba numa tripeça: a) — parte peda­gógica; b) — psicológica; c) — fisio­lógica.

Passando a discorrer sobre a primeira aula do curso, acentua que esta é a aula mais importante, pois vai captar
o interesse da gestante e expor os fundamentos do método. Trata da "motivação" e visa a dar à futura mãe "noções sobre a atividade nervosa superior". A formação dos reflexos absolutos e condicionados é exposta na palavra
mais simples e, de igual modo, é ensinado o mecanismo da formação do reflexo e, a seguir, a origem da dor do
parto. No quadro, é traçado o arco reflexo e a classe fica sabendo da existência e importância do córtex cerebral, sede dos reflexos condicionados. Nesta altura, já sabem as alunas que o reflexo condicionado, "a própria expressão da nossa ambientação na vida", o conhecimento novo que adquirimos, pode desaparecer, ser substituído, reaparecer, o que não acontece com o reflexo incondicionado, que é imutável e inato. E que a dor do parto é um reflexo condicionado.

Necessário fixar bem que todas ast atividades que ocorrem no organismo dependem de um sistema diretor — o sistema nervoso. E o filme projeta ou o mestre traça no quadro negro a zona de inibição, o cordão de isolamento que se forma no córtex, ao chegar ali o es­timulo ou sinal. Toda a significação da palavra, o nosso segundo sistema de si­nalização, é, então, ressaltada.

Aplicando estes princípios à obste­trícia, vamos ver que a contração ute­rina, pelos fatores já explicados, se as­sociou através dos tempos com o fenô­meno dor. Extinguir esse condiciona­mento e criar outros — é o que realiza o novo método. O cérebro é quem comanda. De tal forma que é ensinada esta pequena e profunda história simbó­lica : "Dona Contração faz uma ligação com o Córtex; Dona Dor tenta fazer o mesmo, mas encontra a linha ocupada".

— O médico — diz, encerrando esta primeira parte, o doutor Daniel — não tira a dor da paciente : ensina a supri­mi-la. O método não depende de fé, mas de cooperação.

DA RESPIRAÇÃO

Foi o Dr. Arnaldo Ferreira quem respondeu às nossas perguntas sobre a matéria ensinada na segunda aula. Preliminarmente, explicou que, antes de ser ventilado o assunto específico de ca­da aula, é feita sempre uma recapitu­lação da anterior.

Esta é iniciada com o elogio, va­mos dizer assim, do oxigênio. O que é oxigênio e o que significa para todos os seres vivos — plantas, animais e ho­mens — inclusive para o nenê que vai nascer e que o tira do sangue materno. Em seguida, são ministradas noções de anatomia e fisiologia do aparelho respi­ratório e a gestante fica sabendo que o coração manda oxigênio a todo o corpo e, no útero, através da placenta e do cordão umbilical, ele chega ao feto.

— A respiração — continua a es­clarecer o médico, respondendo às várias perguntas da repórter — até então uma função indiferente, automática, passa a ser controlada, pois vai contribuir para substituir o reflexo nocivo da dor, per­mitindo a formação de um condiciona­mento novo.

Quer isso dizer que a contração ute­rina vai, agora, associar-se — não mais à dor, pois já sabemos que ela não tem linha — mas à respiração.

É salientada, aqui, a importância do diafragma, tanto na respiração to­rácica (com o peito) como na abdomi­nal (com a barriga). No primeiro caso, deve permanecer alto (período de dila­tação) e, no segundo, deve baixar (pe­ríodo de expulsão).

Começam os exercícios práticos de respiração, que se irão aperfeiçoando nas aulas subsequentes. A gestante co­meça a fazer em casa, diariamente, ao acordar e deitar, durante dez minutos, os exercícios de respiração aprendidos.

ATIVIDADE NEURO-MUSCULAR

Eis que a repórter tem oportuni­dade de assistir a esta terceira aula, ministrada a uma das turmas pelos dou­torandos Sabino da Silva Morais Neto e Dalila Miranda, sob o controle da Dra. Puretz.

Nesta aula sobre atividade, ou seja educação neuro-muscular, as alunas aprendem a dominar seus músculos. Já sabem que tudo é dirigido pela cabeça, por aquela parte exterior do cérebro, que se chama córtex.

Na aula sobre respiração, que é re­capitulada, aprenderam um reflexo con­dicionado positivo. Vão, agora, assimi­lar o outro: o relaxamento. A respira­ção e o relaxamento serão as respostas ao estímulo das contrações uterinas, quando começar o trabalho do parto.

O sistema nervoso exerce domínio absoluto sobre todo o organismo. Tan­to a contração muscular como o relaxa­mento são controlados pelo cérebro.

No trabalho do parto, o único órgão-que deve contrair-se, é o útero. O mús­culo contraído gasta oxigênio e, no nosso caso, vai consumir também o oxigênio de que o nenê precisa.

— A primeira razão para a impor­tância do relaxamento no trabalho do parto — explica o professor às gestan­tes atentas — é a redução do trabalho muscular e, além disso, a economia do oxigênio. Outra razão é que mantém o equilíbrio cortical e, portanto, o fun­cionamento dos bons reflexos condicio­nados, contribuindo ainda para que o útero permaneça em contração normal e não se contraia em excesso. A con­tração impede o afluxo de sangue, en­quanto o relaxamento o favorece.

Explica, ainda, que há o relaxamen­to passivo, aquele em que estamos, quan­do dormimos. Trata-se, aqui, de rela­xamento ativo.

Começam, a seguir, variados exer­cícios de relaxamento, totais e segmen­tares; exercícios de relaxamento e con­tração; exercícios associados de relaxa­mento e respiração. Os exercícios são individuais, como se vê numa das fotos: a gestante deita-se na cama, os ombros abaixo do travesseiro, um rolo sob os joelhos, e pratica os exercícios.

— D. Hilda, relaxe a cabeça. A sua cabeça deve ficar como a de uma boneca quebrada. Assim. Agora rela­xe todo o corpo e contraia o braço di­reito.

— É a sua vez, D. Inácia.

Aliás, achamos que todas se saíram muito bem.

Uma nova tarefa elas levam para casa: devem fazer os exercícios apren­didos durante dez minutos, duas vezes ao dia. E há uma recomendação: fazê-los também em pé e sentadas.

PERÍODO DE DILATAÇÃO

Pudemos, igualmente, assistir aula seguinte, referente à primeira fase do trabalho de parto. Ministrou-a o Dr. Paulino Perez.

Após a recapitulação da última au­la, são dadas noções de anatomia e fi­siologia do aparelho genital feminino. Seguem-se esclarecimentos relativos à formação do embrião e seu crescimento e à formação dos anexos (placenta, cor­dão, bolsa d'água) .

Característicos deste primeiro pe­ríodo; 1.° Regularidade das contrações; 2.° Dilatação do colo (de 1 a 10 centímetros) ; 3.° Expulsão do tampão mu­coso; 4.° Rompimento da bolsa d'água.

Quanto ao comportamento da par­turiente neste primeiro período: aplica­ção aglutinada dos conhecimentos adqui­ridos, respiração (torácica) e relaxa­mento, feitos simultaneamente.

Não pode dormir, o que faria a córtex ficar inibida. O ritmo da res­piração é que ajuda a manter o condi­cionamento cerebral.

A exposição claríssima é seguida de exercícios individuais em cima da cama: relaxamento e respiração, respiração ofegante e superficial, lembrando um trenzinho ou a respiração de um cãozinho cansado.

FINAL DO CURSO

Terminada a aula, passamos a ouvir o Dr. Paulo Belfort de Aguiar, que nos falou sobre o conteúdo da aula seguinte.

Trata-se da segunda parte do tra­balho do parto, a expulsão do nenê, a qual é caracterizada pelas contrações mais frequentes e pela vontade de ex­pulsar.

— Como deve comportar-se a par­turiente no sentido do êxito — ausência de dor até o fim do trabalho do parto?

— Ela aprende:

a) Inspiração (abdominal) ;

b) Prender a respiração;

c) Puxar com os braços abertos. como se estivesse remando.

— Desse modo — conclui o médico — o diafragma desce e encosta no útero, e os músculos abdominais se contraem, ajudando o ato final da expulsão do nenê.

Salienta ainda que a parturiente tem de permanecer ativa e que o tra­balho que desempenha, pondo em ação os reflexos novos, é o preço que paga para não sentir dor.

— E a última aula?

— É uma revisão das cinco outras e o ensino de todos os elementos que dizem respeito à ambientação e à ma­nutenção do controle nervoso desde o aparecimento dos primeiros sinais.

Vários médicos estão presentes e a repórter fica ainda sabendo que da últi­ma aula até o parto a gestante recebe assistência individual permanente. Um dos entrevistados afirma que ela chega à sala de partos liberta da sensação de angústia e da presença do medo, pois está de posse de uma nova mentalidade relativamente ao nascimento do ser hu­mano.

E nada ilustraria melhor a afirma­tiva do médico-professor do que o sor­riso de confiança de D. Dinah, a moça que estamos vendo entrar na sala de partos, e a expressão de felicidade de D. Nelly, a moça que acaba de dar à luz, quando disse à repórter, abraçada à sua filhinha:

— Nenhuma, não senti nenhuma dor.

 

Diminui o número de partos anormais os pontos difíceis do problema - Dor: fenômeno subjetivo - A consolidação dos novos reflexos - Ouvindo o professor Grelle e seu assistente, Dr. Nahoum.

No processo das duas primeiras re­portagens, fomos encontrando al­guns pontos mais sutis e difíceis, que solicitavam um esclarecimento à parte. Chegou, agora, o momento de buscar uma resposta para todas essas interro­gações que foram surgindo no curso do trabalho, e ninguém mais indicado para ouvi-las e esclarecê-las do que o próprio diretor da Maternidade Clara Basbaum, Prof. Francisco Carlos Grelle. O que segue, representa, assim, o resumo da conversa que mantivemos, ontem, com aquele ilustre obstetra e com o seu prin­cipal assistente, Dr. Jean, Claude Na­houm.

O PARTO DOS ANIMAIS

— Se o dar à luz — foi a primeira pergunta que formulamos — é um ato naturalmente indolor, como se explica a dor do parto sentida pelos animais?

— A dor — responde o professo Grelle — é um fenômeno subjetivo, ma só podemos julgá-la através de suas ma­nifestações objetivas. Não nos é per­missível, pois, asseverar que os animais sentem verdadeiramente dor à parturi­ção. Não há duvida que eles assumem reações características ao dar à luz. Garantir, entretanto, que essas reações são a exteriorização da dor, será um tanto temerário fazer.

Prosseguindo, ele explica que, ao pressentir o parto, o animal procura logo um local apropriado, procura isolar-se para dar à luz.

— Tal como acontece com as índias, que procuram o mato — diz o Dr. Nahoum.

A repórter fala, então, na dor ma­nifestada por alguns animais domésticos.

A tese desenvolvida pelos nossos en­trevistados diz respeito ao comporta­mento do animal no seu "habitat". Agora, eles explicam que os cruzamen­tos biológicos dos cães, por exemplo, e o trazê-los para o convívio humano, os afagos excessivos, os ambientes requintados — influem, sem dúvida, em mui­tas daquelas manifestações dolorosas.

É, aí que o Dr. Nahoum tira da estante uma revista médica e lê o se­guinte trecho de um trabalho do Prof. Rodrigues Lima sobre "Ética de Anal­gotócia" :

"A 'vira-lata' suporta o parto de modo bem mais estóico que a "cadeli­nha de apartamento", que grita estrepi­tosamente ao expulsar seus filhotes".

Achando que, depois destas pala­vras, até o "advogado do diabo" ficaria sem réplica, passamos a abordar outro ponto.

DO CONDICIONAMENTO

— A contração uterina em si não é um fenômeno doloroso?

— Doloroso apenas por condiciona­mento. Quer dizer : acumulado do re­flexo que se foi formando através dos séculos.

— Por que o curso só se inicia no sétimo mês da gravidez e não no começo desta?

— Seria o ideal — responde o Prof. Grelle.

Esclarece, no entanto, que o curso muito prolongado iria cansar a gestante e a interrupção não é conveniente, por­que ocasiona o descondicionamento. In­terromper o curso é desligar-se a fu­tura mãe dos reflexos positivos que es­tava adquirindo e, por consequência, a volta ao reflexo negativo, à imagem da dor, à noção errada da fatalidade do sofrimento. O que todos, acima de tu­do, devem ter presente, é que o curso ministrado a partir do sétimo mês é suficiente, como estamos vendo, para que o parto se realize sem dor. Afir­ma, contudo, que o ideal seria que, des­de o começo da gestação ou, antes, na fase pré-gravídica, ou mesmo bem an­tes, no período de transição da menina e moça, se iniciasse a luta para desatar a humanidade feminina do reflexo mi­lenar da dor do parto.

— Professor, para um segundo parto, há necessidade de novo curso ?

— Sim, há necessidade.

— Não basta aprender uma vez então?

— Não, porque o condicionamento se apaga ou precisa ser reforçado.

— Mas o segundo curso — explica o Dr. Nahoum — será muito mais simples.

— Se o parto sem dor for univer­salizado, ainda assim haverá necessidade de as gestantes fazerem o curso?

— Não, aí não haverá mais neces­sidade, — diz, ainda, o Dr. Nahoum — pois as vitórias individuais se terão transformado em vitória coletiva, a quantidade se terá transformado em qualidade.

(Pensamento da repórter: A dor é substituída pelos novos condicionamen­tos; estes se cristalizam, dando lugar a uma realidade nova).

Resolvemos expressá-lo em voz alta.

— É isso mesmo aprovam os doutores.

DO MÉTODO

— O método é aplicado a toda ges­tante?

— Sim, desde que ela queira fazer o curso.

— Os senhores têm observado fa­lhas ?

— Os casos bons e ótimos alcan­çam 90%; a incidência de falhas é observada em cerca de 10% de casos, mas nunca — acrescenta o Dr. Grelle — nunca totalmente.

— A que se atribuem as falhas?

— Algumas ao tipo nervoso da mu­lher, mas a maioria à não participação ativa da parturiente, (elas mesmas reconhecem — frisa o professor) ao fato de serem assistidas por médico não fa­miliarizado com o parto sem dor e ao ambiente doméstico hostil ao método.

Esclarece que a hostilidade da so­gra, a descrença do marido, etc., influem desfavoravelmente no ânimo da gestan­te, ameaçando a estrutura do condicio­namento positivo em formação. Há ne­cessidade da coordenação de todos os elementos, motivo pelo qual vai realizar-se, na Maternidade Clara Basbaum, o 2.° Curso de Parto sem Dor (o 1.° rea­lizou-se em janeiro) para funcionários da casa, incluindo telefonista, serventes, etc., com o propósito de cercar a par­turiente de um ambiente homogêneo, sem quebras, inteiramente propicio à manutenção dos bons reflexos adquiri­dos.

— O número de partos anormais diminui?

— Diminui — responde o Prof. Grelle. — Mas não desaparece. Dimi­nui, porque há muitas anormalidades causadas pelo mau funcionamento ute­rino, o qual, por sua vez, é devido ao medo e à dor, que agora desaparecem. Permanecem, entretanto, todas as anor­malidades causadas por defeito n ba­cia, posições fetais anômalas, etc. En­tretanto, mesmo nesses casos, a partu­riente comporta-se melhor.

Perguntamos, em seguida, se havia oposição ao método.

— Sim — responde o jovem assis­tente. — Os motivos? O condiciona­mento tradicional, a maldição bíblica, a origem russa, a resistência de muitos obstetras mais velhos, etc.

É, quando se fala de novo na pa­lavra de Pio XII, que veio abalar pro­fundamente a objeção cujo argumento é, apenas, a origem do método.

— O método é estável ou está em evolução?

— Evidentemente — explica o Prof. Grelle — sofre modificações no tempo e no espaço. A técnica do método mo­difica-se com a experiência e com as condições ambientais, embora o substra­tum permaneça inalterável.

1ª. CONFERÊNCIA BRASILEIRA SOBRE PARTOS SEM DOR

Chega, neste momento, às mãos do diretor da Maternidade Clara Basbaum, uma comunicação referente à Primeira Conferência Brasileira sobre Partos sem Dor, que se realizará em S. Paulo, a 6 e 7 de julho próximo, e a repórter aproveita a ocasião para pedir detalhes sobre o conclave.

A Conferência, que é uma inicia­tiva conjunta da Maternidade Clara Basbaum e da Sociedade Pavlov de Fi­siologia e Medicina, de S. Paulo, será presidida pelo Prof. Octavio Rodrigues Lima e terá como vice-presidentes vá­rios professores e diretores de Materni­dade: professor Francisco Carlos Grelle, diretor da Maternidade Clara Basbaum; Dr. Waldir Tostes, diretor da Materni­dade do H. S. E.; Dr. Osvaldo Nazareth, diretor da Casa da Mãe Pobre; Prof. Vitor Rodrigues, Dr. Armindo Sarmento, Dr. A. Campos da Paz, além de outros, aguardando-se ainda muitas adesões. Os secretários-gerais são o Dr. Hirsch Schor, atuando em São Paulo, e o Dr. Jean Claude Nahoum, no Rio de Janeiro.

Constará de: 1 — Vários cursos para gestantes, ministrados por médi­cos paulistas e cariocas; 2 — Conferên­cias médicas; 3 — Apresentação de tra­balhos, em que será discutida a expe­riência atual, devendo a Maternidade Clara Basbaum apresentar quatro relatórios.

A 1ª. Conferência Brasileira sobre Partos sem Dor conta com a adesão de vários parlamentares e terá, como ponto alto, a presença do dr. Lamaze, diretor da Maternidade dos Metalúrgicos de Paris, introdutor do método psico-pro­filático na França, pioneiro do parto sem dor no mundo ocidental.

O PRAZER DE DAR À LUZ

No fim da palestra, que tão claros tinha tornado os ângulos mais obscuros do fascinante assunto, lembramo-nos de uma expressão do Dr. Schor, quando terminou, no Curso Pavlov, a que nos referimos na primeira reportagem, a sua conferência sobre o novo método. Então, perguntamos:

— Tem cabimento aquela expres­são: "o prazer de dar à luz" ?

Ambos os médicos responderam afirmativamente. Esclarecem que não é mais pelo preço da dor que a mulher pode estreitar nos braços o seu nenê. O nenê é a expressão, o fruto do amor, que vem, agora, sem sofrimento. E, se não há mais dor, resta "o prazer de dar à luz".

 

Elas dizem que não sentiram dor lendo o relatório das puérperas e ouvindo várias senhoras que se submeteram ao novo método - "adorei o parto sem dor", diz uma jovem mãe – Um parto sem dor depois dos quarenta

Não estamos mais sob o impacto da notícia do parto sem dor; o que pa­recia conto de fadas, acontecimento que só poderia ocorrer em Shangri-Lá, está se realizando em terras do Brasil.

O trabalho jornalístico que hoje termina, representa um esforço de in­terpretação desse belo e surpreendente passo da medicina, que é a abolição do sofrimento no ato natural de dar à luz, e das primeiras experiências realizadas na capital brasileira.

Até agora, ouvimos a brilhante equipe de especialistas da Maternidade Clara Basbaum. Ouvimos, até agora, a palavra dos médicos; hoje vamos ouvir a palavra das mães, pois encerramos a série iniciada precisamente há duas se­manas, . com a divulgação de alguns de­poimentos de senhoras que se submete­ram ao novo método, colhidos através da leitura das impressões que elas mesmas deixaram escritas, anexas às suas fichas, e da conversa que mantivemos com várias outras.

A PRIMEIRA EXPERIÊNCIA

A documentação referente ao parto sem dor, na Maternidade Clara Bas­bamn, inclui as impressões escritas pe­las puérperas, que relatam o que sen­tiram e o que fizeram desde o apareci­mento dos primeiros sinais, sendo de notar uma constante nas declarações em apreço: a absorção, em maior ou menor intensidade, dos novos condicionamentos da respiração e do relaxamento.

O primeiro parto realizado pelo método psico-profilático foi o de uma mãe solteira, de 18 anos, que assistiu, apenas, a duas aulas.

Apesar de não estar conveniente­mente preparada, pôde o dr. Grelle observar: "Verifiquei que a mesma não mostrou o menor sinal de sofrimento físico".

E a mocinha declara no seu minu­cioso relato :

"... e no momento que veio uma contração, enchi a barriga de ar e prendi a respiração". E, logo a seguir: "e aí comecei a sentir que estava saindo al­guma coisa em baixo e comecei, tam­bém, a sentir uma coisa leve e o doutor disse para eu não fazer mais força. Co­mecei a respirar normalmente e senti uma satisfação imensa de ter comparti­lhado desde o início".

RELATÓRIO DAS PUÉRPERAS

Vamos continuar a examinar o que dizem as mães que se submeteram ao método.

M. E. G. fez todo o curso. Eis o que ela escreveu, duas horas depois do parto:

"Senti quatro contrações fracas no ônibus, uma no carro e seis contrações aqui, fracas. O doutor disse-me que eram com espaço de trinta segundos e depois senti uma contração em cima da outra e duas vezes vontade de expulsar alguma coisa, da segunda vontade de expulsar fiz o movimento de remar e a criança nasceu. Senti dor apenas nas cadeiras, mas tive um parto muito bom sem dor".

M. S., de 16 anos, diz que, já na mesa, respirava fundo e remava. Com alguns movimentos de remar, ouviu o choro do garoto e a tosse, não sentindo qualquer dor; "sentia, ao contrário, uma grande alegria".

C. R. G. é peremptória:

"As primeiras palavras que eu es­crevo são estas: não há parto com dor".

Uma professora, cliente particular do Dr. Grelle, revelando-se muito bem motivada, escreveu:

"Vinha há vários dias tendo mo­mentos de pavor, à proporção que se aproximava a época do nascimento, lem­brando-me dos padecimentos do ano pas­sado, por ocasião do nascimento de mi­nha filha". E, mais adiante: "...di­zendo que não haveria dor e sim con­trações, é que comecei a raciocinar que o meu sofrimento dependia unicamente do meu modo de agir na hora do nasci­mento. Comecei a pensar que eu devia me manter calma e achar que não era nada e fazer a respiração na ocasião das contrações, conforme o doutor Grelle dissera".

A. J., moradora de morro, sofrera muito nos seus cinco partos. Eis o que ela diz, relativamente ao sexto:

"Eu tinha dúvida do parto sem dor, porque já tive cinco filhos e sem­pre com muita dor."

"... quando vinha a contração, a dor queria vir, mas eu começava a res­pirar e tudo passava e é por isso que posso dizer que este parto foi bem dife­rente dos outros."

Uma outra, que também sofrera hor­rivelmente com o primeiro parto, es­creve:

"Achei este parto muito diferente do meu primeiro, porque, no primeiro, passei um dia e uma noite passando mal. Na hora de nascer, senti muita dor e deste não senti nada e foi tudo muito rápido. Afinal, foi a melhor idéia que apareceu para as mulheres."

Outra paciente consigna :

"Minha filha nasceu sem dor, com­pletamente sem dor."

M. M. T. assim se manifesta:

"... começaram pela noite se desen­cadeando as contrações, as quais, obede­cendo ao relaxamento e à respiração, decorreram sem a mínima dor."

L. de L. deixou escrito:

"... eu comecei a remar, enchia a barriga de ar e remava, com duas re­madas a criança nasceu sem eu sentir dor."

D. C., depois de contar como se comportara, afirma:

"Dessa maneira transcorreu o par­to: sem nervosismo, sem dor."

Outra parturiente escreve:

"Às 2,30 horas chegou o momento supremo, o qual não senti dor alguma."

N. de S., do grupo das que assimi­laram bem as lições, registra:

"Não senti dor, porque fiz todos os exercícios que os médicos mandaram."

M. de N. escreve no seu relatório :

"Tendo dado à luz às 10,30 horas, sendo que o parto sem dor requer es­tudo, ensinaram-me a respirar e ficar relaxada, não sentindo nada e não sen­tindo dor de parto."

Afirmativas idênticas saltam dos demais relatórios que examinamos, algu­mas em tom sóbrio e outras eufóricas, como a de uma empregada doméstica :

"Meu parto foi uma verdadeira ma­ravilha, por isso eu estou disposta a ter outro."

CONVERSANDO NA MATERNIDADE

Eis-nos, agora, em busca da pala­vra não escrita, da palavra viva, pro­nunciada pelos lábios da parturiente. Enquanto entrevistávamos os médicos e assistíamos a aulas, tivemos oportunida­de de tomar ligeiras declarações de al­gumas pacientes, todas no sentido da completa ausência de dor. E o fotógra­fo pôde fixar alguns sorrisos amplos, de confiança e de felicidade, que dizem mais do que qualquer palavra.

Agora, duas moças que fizeram o curso na Maternidade e acabam de ga­nhar nenê estão à nossa espera em sa­las diferentes. Ouvimo-las isoladamen­te, sem testemunhas, sem médico nem enfermeira perto.

D. Selma é empregada doméstica e, tanto na sua casa como na casa onde trabalha, houve compreensão. (E essa compreensão, já sabemos que é um dos elementos para haver êxito). Teve dois filhos, que morreram:

— Ah, vi estrelas naqueles dois par­tos — diz, referindo-se às dores que sofreu.

Fez o curso com cuidado:

— Eu fazia exercícios em casa, re­laxava e respirava ao mesmo tempo. A senhora sabe? Aprendi a respirar bem: com o peito e com a barriga.

— E quando chegou a hora?

— Os doutores ensinam que a gente devia prestar atenção às contrações e aos sinais e a ter calma sempre. Quan­do começaram as contrações e apareceu o primeiro sinal, disse ao meu marido que estava na hora de vir. Vim bem relaxada no carro.

Concluindo, diz:

— Quando fui p'ra mesa, enchi o peito de ar e remei. E a menina taí.

Sorriu, aconchegando a recém-nas­cida aos seios cheios de leite.

— E não sentiu dor ?

— Nenhuma dor, não, senhora.

Passamos, em seguida, a ouvir D. Julia, que deu à luz o primeiro filho, uma menina, sexta-feira, dia 13.

É muito jovem e comunicativa. Iniciou o curso no oitavo mês da gesta­ção, por não saber antes da sua exis­tência. Foi a doutora Olivia (e a gente lembra aquela outra humana doutora Olivia, de "Olhai os lírios do campo") que a aconselhou. De modo que assis­tiu, apenas, a quatro aulas, mas não houve diferença, porque apreendeu bem os ensinamentos ministrados.

Conta que, às duas horas, percebeu o primeiro sinal. Dormiu até as sete. Trabalhou em casa, tomou banho.

— Quando vinham as contrações, eu relaxava e respirava.

Às 10,15 horas, com 3 centímetros de dilatação, veio para a Maternidade. Às 17,30 horas, foi para a mesa e a menina nasceu às 18,20 horas.

— O doutor me entregou logo a criança, como havia prometido. Fiquei tão contente.

Diz que tem muito leite e que, de­pois do parto, foi jantar. Na segunda-feira, desceu para o curso, servindo de motivação para as outras gestantes.

— Contei para elas que foi uma beleza.

— Correu tudo tão bem assim'?

— Claro. Adorei o parto sem dor e quero ter outros filhos — diz com um largo sorriso.

DUAS VISITAS

D. Teresinha, outra mamãe-broto, nos recebe na sua bela casa. Conta que fez o curso na clínica particular da Dra. Elza Puretz. Estava no fim da gravidez e teve, apenas, quatro aulas, tendo recebido as outras duas na própria Maternidade, ministradas pelo Dr. Arnaldo, (a Dra. Elza estava ausente do Rio) durante as horas do "rebate falso", depois do qual voltou à sua residência. Domingo, às 21 horas, senti contrações; mais fortes, passando a fazer o exercício do trem, quando elas apare­ciam. Nos intervalos, relaxava o corpo, procurando minha recuperação. Às 23 horas consegui dormir; acordei às 2,30 da madrugada, sentindo contrações mui­to fortes e o rompimento da bolsa.

Depois de dizer que fizera os exer­cícios enquanto o marido fora buscar o carro e, depois, durante a viagem, con­tinua :

— Chegando à Maternidade, fui ,atendida pelo Dr. Jean, que passou a orientar a respiração conforme as con­trações.

Frisa que jamais sentiu dor du­rante o trabalho do parto e declara:

— Quando recebi ordem para fazer o exercício de remar, grande foi o meu contentamento e passei a executá-lo com perfeição. Senti então a maior alegria da minha vida, quando ouvi o choro de meu filhinho.

O filhinho que acaba de mamar e que está ali perto, sadio e risonho, no seu carrinho.

E a encantadora Teresinha reafir­ma que é uma realidade o parto sem dor e elogia a dedicação dos médicos da Maternidade Clara Basbaum.

* * *

Eis-nos, finalmente, no apartamen­to da senhora Tsilha, dama de fina cul­tura, com 44 anos completos.

Conta que passou nervosa e preo­cupada grande parte da sua gravidez, porque muitas pessoas lhe diziam que, devido à idade, teria que submeter-se à cesariana. Ia ser o seu primeiro parto, pois tivera, apenas, abortos - dois — há vários anos.

Ao ter conhecimento da existência do método psico-profilático e resolver a ele submeter-se, tornou-se calma, con­fiante. Já estava, porém, no fim da gravidez e fez curso intensivo em clini­ca particular. Seus membros revelaram enorme flexibilidade para os exercícios de relaxamento ela começou, nos exercícios de respiração, a aprender a con­trolar o diafragma. Como o seu meni­no tardou alguns dias, teve oportunida­de de repetir as lições, de modo que viu chegar o dia do nascimento completa­mente segura de si, convicta de que seu parto iria processar-se sem dor.

Faltavam vinte para meia-noite quando sentiu a primeira contração e percebeu o primeiro sinal. Não chamou ninguém. Respondeu à contração com o exercício concomitante do relaxamento e da respiração torácica. Ao perceber que as contrações se amiudavam, avisou ao marido e demais pessoas da família. A mala com as roupas da mãe e do nenê já estava pronta. Ela arrumou-se, fez a maquilagem e a preocupação em não falhar era tal que, enquanto o carro não vinha, ao sentir uma contração, sen­tou-se sobre a mala, na calçada, e res­pirou. Comportamento idêntico teve durante a viagem e, depois, na Mater­nidade, durante a espera, que foi rela­tivamente curta, pois o nenê, um me­nino, nasceu quando faltavam 15 para as 4 do dia primeiro. Principalmente ao referir-se a seu comportamento du­rante o período expulsivo, parecia uma mestra ao narrar como aplicou os novos condicionamentos.

A senhora não sentiu nenhuma dor então? Nem gemeu ?

Ela ri e afirma que, em vez de ge­midos de dor, pilheriava a respeito da data do nascimento do menino: primeiro de abril.